O Banco Central informou que o acesso ao Sistema de Informações de Valores a Receber (SVR), que permite a consulta de possíveis valores “esquecidos” em contas de banco, voltará a funcionar no dia 14 de fevereiro.
O sistema saiu do ar devido à corrida por informações no site do BC e foi suspenso na útlima terça-feira. O BC abribuiu a pane à quantidade inesperada de acessos, que derrubou os sites e o sistema.
Segundo a autoridade monetária, a quantidade de acessos foi 20 vezes maior do que em um dia de alto volume e 50 vezes maior do que num dia normal. Nas 24 horas em que esteve no ar, o sistema permitiu o resgate de R$ 900 mil por 8,5 mil pessoas. A estimativa é que o total nos bancos some R$ 8 bilhões.
“Para que o SVR possa voltar a atender a todos os cidadãos com estabilidade e segurança, o BC está investindo fortemente na ampliação de sua capacidade de atendimento”, diz a nota do BC.
Segundo o BC, a partir do dia 14 de fevereiro será possível consultar o valor a receber. Se houver algo, o cidadão será informado de quando poderá solicitar a transferência para sua conta. Esses solicitações poderão ser agendadas a partir do dia 7 de março, com data informada pelo sistema.
Em nota, o Banco Central ressaltou que não há risco de prescrição ou perda dos recursos. Eles permanecerão guardados nas instituições financeiras onde já estavam.
Com os relatos de crimonosos utilizando o SVR para aplicar golpes, o BC também informou que não entra em contato com os cidadãos e que qualquer informação sobre os valores só poderá ser obtida a partir do dia 14 de fevereiro pelo sistema.
“A solicitação de resgate no SVR será feita por meio de usuário e senha e os recursos serão transferidos diretamente das instituições financeiras para os cidadãos, que não devem fazer qualquer depósito prévio a qualquer pessoa ou instituição”, afirma a nota.
Veja como vai funcionar:
14 de fevereiro: O sistema volta ao ar e os cidadãos poderão verificar se tem algum valor a receber. Em caso positivo, o cidadão será informado sobre a data em que poderá solicitar a transferência dos valores.
7 de março: As solicitações passam a poder ser agendadas na data informada pelo sistema.
Infraestrutura pode não ter suportado demanda
Rafael Umann, CEO da Azion, empresa que provê serviços de infraestrutura em tecnologia, ressalta que dois fatores podem ter feito o site sair do ar. O primeiro é a falta de infraestrutura para suportar o volume de acessos e o segundo seria uma questão na programação do sistema.
Umann explica que se for o primeiro caso, o problema poderia ser resolvido em poucas horas com o aumento de capacidade dos servidores. Já se o sistema precisar ser reescrito por programadores, poderia levar alguns dias para retornar.
Daniel Arruda, sócio da Ismac, plataforma de cibersegurança para empresas, também vê diferentes possibilidades:
— O site não suportou o excesso de demanda. Isso pode ter ocorrido em razão do número de servidores disponíveis para o site não ter dado conta do volume de tráfego ou pela falta de um sistema que permita abrir novos servidores e escalar os acessos em caso de aumento de demanda. Mesmo o link de conexão pode ter ficado aquém do necessário para esse tamanho de tráfego.
Ainda que o Banco Central possa não ter dimensionado a quantidade de servidores para suportar uma carga de acesso tão grande, destaca ele, o problema pode estar ligado ainda ao tipo de dado processado pelo site:
— O BC lida com dados sensíveis. Então, a infraestrutura tem de ter segurança adequada, não pode utilizar servidores públicos. É um problema simples de solucionar, mas a solução tem de preservar a segurança dos dados e passar pela burocracia de um órgão ligado ao governo.
R$ 8 bi ‘esquecidos’
O sistema possibilita a consulta de possíveis valores ‘esquecidos’ em contas bancárias encerradas, parcelas de empréstimos ou recursos não procurados de grupos de consórcio, por exemplo.
Segundo o BC, um levantamento de junho de 2021 apontou que os clientes tinham cerca de R$ 8 bilhões a receber dos bancos.
Nesta primeira etapa da ferramenta, será possível resgatar em torno de R$ 3,9 bilhões. São recursos de contas-corrente e poupança encerradas, cotas de capital e rateio de sobra de cooperativas de crédito, recursos de consórcios e tarifas, parcelas ou obrigações relativas a operações de crédito, como empréstimos e financiamentos cobradas indevidamente.
Nesse último caso, somente os recursos de instituições que assinaram um termo de compromisso com o Banco Central estarão disponíveis.
Dinheiro em corretoras poderá ser resgatado
Foi o caso do banco Itaú em junho de 2020. Naquela época, a instituição fechou um acordo com o Banco Central para devolução de R$ 75,6 milhões aos clientes por cobrança indevida de tarifas entre 2008 e 2018.
Ao longo de 2022, o BC pretende também incluir os recursos de tarifas e parcelas relativas a operações de crédito mesmo que não haja um termo de compromisso assinado pela instituição financeira com o BC.
Saldos de contas de pagamento, sejam pré-pagas ou pós-pagas, também entrarão.
Além disso, a previsão é de que contas encerradas em corretoras ou distribuidoras de títulos mobiliários também possam ter seu saldo resgatado por meio do sistema. Com isso os R$ 4,1 bilhões restantes poderiam ser consultados.
Necessidade leva consumidor com muita sede ao pote
O anúncio de haver R$ 8 bilhões em valores “esquecidos” em contas bancárias e outras fontes que devem ser retornados ao consumidor e a empresas impressiona, diz Andrew Frank Storfer, diretor executivo da Anefac, sobre tudo num momento de inflação alta e emprego e renda em baixa.
— Todo mundo está precisando (de dinheiro). Quando a população enxerga a possibilidade de conseguir dinheiro em algum lugar, ela vai com muita sede ao pote. Todo início de ano é mais difícil. Neste início de ano, tem sorte quem ainda tem um carro e vai pagar IPVA, por exemplo — diz o executivo.
O desafio ao bolso do consumidor nos primeiros meses de 2022, continua ele, é maior que de hábito, porque o país vem “andando de lado” ao menos desde 2015.
— São dois anos de pandemia, com desemprego muito alto e renda média menor porque os salários, de modo geral, também foram reduzidos em meio a uma oferta de mão de obra maior do que de vagas. As pessoas usam o que têm a receber para pagar dívidas. O crédito está difícil; o juro, subindo. O juro (alto) aleija, mas a falta de dinheiro mata — sublinha ele.
Ainda que o valor a que grande parte dos que tem direito a uma fração desses R$ 8 bilhões seja reduzido — às vezes a centavos ou a poucos reais — o executivo frisa que “não é esmola, mas direito do cidadão e das empresas”:
— É uma decisão interessante do Banco Central ter facilitado o acesso do cidadão a esses valores. É dinheiro que fica lá, não é corrigido, mas os bancos utilizam.