Líderes da Câmara dos Deputados chegaram a um acordo para fortalecer as regras do novo plano fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, incluindo gatilhos automáticos para ajustar as despesas no caso de não cumprimento da meta. As medidas incluem a proibição de concursos públicos e aumentos para servidores.
No entanto, a política de valorização do salário mínimo e os gastos com o programa Bolsa Família não serão afetados por esses mecanismos, conforme solicitado pelo presidente. De acordo com o relator, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), esses dispositivos não terão impacto nos gastos desses programas.
“O salário mínimo e o Bolsa Família são excepcionalizados. O Bolsa Família, por ser despesa obrigatória, e o salário mínimo porque [o colegiado de líderes] fez acordo aqui para que pudéssemos excepcionalizar”, afirmou Cajado, após reunião com lideranças da Câmara na residência oficial do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), na noite desta segunda.
Em meio à discussão dos gatilhos, o governo e o Congresso chegaram a debater a possibilidade de travar os aumentos reais do salário mínimo (acima da inflação) em caso de estouro da meta fiscal. Essa sanção seria aplicada apenas em situação extrema, se o descumprimento ocorresse por dois anos seguidos.
A possibilidade gerou reação dentro do PT e no próprio governo. Em reunião com o núcleo de governo nesta segunda-feira (15), Lula definiu como prioritária a preservação de uma política de valorização do salário mínimo e do programa Bolsa Família. A orientação do petista era de que esses dois itens ficassem imunes às sanções no novo arcabouço fiscal.
Apesar do acordo, a votação do novo arcabouço fiscal proposto pelo governo foi adiada para a próxima semana. Na quarta-feira (17), a expectativa é aprovar apenas a urgência do projeto, que lhe garante prioridade na pauta da Câmara. Segundo Cajado, há uma expectativa de votar o mérito do texto na outra quarta-feira (24).
Segundo interlocutores, a redação do arcabouço deve prever que os gatilhos não travam o funcionamento da política de valorização do salário mínimo —cujo desenho ainda precisa ser validado pelo Congresso.
Isso significa que, se prevalecer a proposta do governo Lula, o piso nacional sempre será reajustado pela inflação mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes, mesmo em caso de descumprimento da meta. Por outro lado, somente o reajuste real prescrito pela política poderá ser adotado nesse cenário —ou seja, ganhos ainda mais generosos ficariam inviabilizados.
A excepcionalização desses pontos atende a uma demanda do PT, que precisou ceder em outras questões. A sigla vinha resistindo à implementação dos chamados gatilhos de ajuste, mas o acerto final prevê a inclusão desses dispositivos no texto.
No primeiro ano de descumprimento da meta, o governo não poderá criar novos cargos, ampliar auxílios, vantagens, criar novas despesas obrigatórias e conceder novos incentivos fiscais.
Também ficará proibida a adoção de medida que implique aumento de despesa obrigatória acima da inflação —exceto no caso do salário mínimo, que poderá seguir a política de valorização.
Se a meta ainda assim for descumprida pelo segundo ano seguido, entram em cena outras medidas de ajuste, que proíbem a concessão de aumentos salariais a servidores e realização de concursos públicos.
O relator também vai prever no projeto de lei que o governo tem a obrigação de contingenciar despesas, caso haja frustração de receitas ou aumento de outros gastos que ameace o cumprimento da meta fiscal no exercício. Esta seria uma medida prudencial adotada pelo gestor para tentar evitar o estouro da meta.
A inclusão das sanções vinha sendo alvo de cobranças do mercado e de parlamentares de centro e direita. Esse grupo almejava obter uma norma mais rígida. De outro lado, havia pressões vindas do próprio PT por um afrouxamento das diretrizes.
Pela proposta original do governo, a nova regra tem dois pilares: um limite para o crescimento de gastos (equivalente a 70% do avanço real da arrecadação) e uma meta de resultado primário (obtido pela diferença entre receitas e despesas).
O objetivo traçado por Haddad é zerar o déficit já no ano que vem e chegar a um superávit de 1% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2026.
As metas de primário possuem uma margem de tolerância, de 0,25 ponto percentual para mais ou menos. Se mesmo assim o objetivo for descumprido (isto é, o resultado for pior do que o permitido por essa banda), o ritmo de correção do limite das despesas cai a 50% da alta nas receitas.
Não havia, porém, uma lista de medidas específicas que deveriam ser adotadas para assegurar que as contas retomem a trajetória de equilíbrio. Por isso, diferentes siglas querem prever sanções mais rígidas em caso de descumprimento das metas fiscais, enquanto os petistas resistem a esses mecanismos.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que o acordo construído com os líderes cria um ambiente favorável à aprovação da proposta na semana que vem. Segundo ele, há um compromisso da maioria dos líderes para votar a urgência ainda nesta semana. “O único partido que ia analisar se ia votar a urgência ou não é o PL”, afirmou.
“O entendimento está muito consolidado. Posso dizer que estou muito seguro de que aprovaremos essa matéria, porque o país precisa, o ministro Haddad teve a sensibilidade necessária, o governo ajustou as suas posições, o relator igualmente e as bancadas também. Claro que é a média da Casa, não é só um lado”, disse Guimarães.